Nunca é tarde para aprender o novo

Incentivado por uma filha, Douglas Antonio Melo, 69 anos, descobriu a Universidade Aberta à Terceira Idade (Unati) no ano passado. Matriculado, neste semestre, nas disciplinas de Dança Circular e Aplicativos Celulares para Vida Cotidiana, ele viu na universidade uma maneira de ocupar o tempo, buscar novos conhecimentos e ressignificar a forma de viver a chamada terceira idade.

O aposentado, que atualmente vive sozinho, aprende como lidar com as novas tecnologias para comunicar com suas três filhas, além de receber e transmitir informações. “O que entendo da velhice é não achar que tudo que foi ou já era. É claro que algumas coisas são contramão por causa da idade, mas a gente deixa isso e procura viver. Meu pai, por exemplo, tem 96 anos, levanta cedo e cuida das galinhas no quintal. Pretendo, no mínimo, chegar aos 110 anos”, declarou o aluno.

Mais do que um marco temporal na vida do indivíduo, a velhice traz consigo outras questões que refletem e, ao mesmo tempo, são influenciadas pela cultura de uma sociedade. Com a missão de incentivar o envelhecimento ativo e modificar as lentes culturais do que é ser velho, a Unati chega aos 25 anos de história com novos horizontes pela frente. Além de fazer um trabalho com os idosos da comunidade, projetos inter-geracionais estão sendo realizados de forma que a velhice possa ser ressignificada como uma fase natural da vida humana: “vivenciamos uma cultura cujo valor moral é a juventude. Um dos objetivos é desconstruir o mito da inutilidade, porque em qualquer tempo da vida existem condições que favorecem o aprendizado”, refletiu a coordenadora do Programa de Gerontologia Social (PGS), profa. Lisa Torres.

Uma das premissas básicas do Programa é promover o envelhecimento ativo a partir de um viés aplicado em vários países, principalmente na Europa, que já conta com uma parcela significativa da população envelhecida. “Utilizamos o paradigma Life long learning, que é a aprendizagem ao longo da vida. Tiramos aquela ideia mítica de que envelhecer é ser inútil, não ter mais significado, estar sozinho ou não ter pessoas ao lado que possam favorecer o aprendizado”, disse.

A partir deste contexto, a Unati oferece, atualmente, 13 disciplinas que favorecem essa discussão. O conteúdo é adaptado para a realidade em que os idosos vivem, indo além de um passatempo: “as pessoas conseguem perceber que a morte não é só o fim, a pessoa pode morrer diariamente se não conseguir perceber que a velhice é uma fase da vida”, complementou.

Para a coordenadora, são as sementes disseminadas nos espaços acadêmicos que podem mudar a forma de pensar da sociedade. Ela ressalta que o envelhecimento ativo não implica na ausência de doença, mas sim na preservação da capacidade funcional do idoso. “Trabalhamos com um público que consegue viver apesar das doenças crônicas e de outras questões. Eles são sujeitos independentes”, observa Lisa.

Foto: Weslley Cruz

Luiza Carneiro de Brito, 85, é uma das provas do empoderamento do idoso. Ela sempre participa de excursões Brasil afora e, por indicação de uma amiga, descobriu a Unati e é uma das calouras deste semestre. Solteira e sem filhos, ela cursa Inglês para “desvendar” as novas tecnologias e otimizar o uso de aplicativos no seu celular. “Comprei um celular novo que tem muitos aplicativos, mas só aprendi a usar o Whatsapp, ligar e desligar o aparelho. E estou aqui, para aprender”, conta.

Uma segunda casa

Viúva em 1998, Irene Maria dos Santos, 77, percebeu que era preciso tocar a vida e transcender ao luto. Ela ingressou na Unati em 2002 após escutar uma propaganda no rádio e desde então é uma das veteranas da universidade. Irene acorda às 6 horas, prepara o seu chá, toma o remédio para pressão e pega dois ônibus para chegar à Área 2, local onde faz aula de dança. “Aqui eu nasci, vivi e estou vivendo. Às vezes a gente erra os passos da dança, porque a memória já não é tão boa, mas a gente aprende e, para mim, é uma segunda família. Antes tomava seis remédios, hoje tomo só um”, declarou a aluna.

Inês Alves Noleto, 80, tem na bagagem de vida uma família grande: dez filhos, 26 netos e seis bisnetos. Além de frequentar a Unati, ela faz hidroginástica, curso de crochê e outras atividades para preencher o tempo. “Tive um início de depressão e gosto de fazer várias coisas. Nas aulas eu converso e o que esqueço a professora me lembra. Quando meu companheiro não está viajando, almoço com ele”, conta Inês, ao se referir ao filho caçula que mora perto do apartamento onde ela vive.
Professora da disciplina de dança da Unati, a profa. Beth Barros relata o sentimento de dever cumprido ao ver, nos depoimentos, a autonomia dos idosos. “O nosso desejo é que essas pessoas saiam, da melhor forma possível, da condição de dependência de todas as formas. Dá para perceber, na própria aula, o crescimento dos alunos. Não é um treinamento físico radical, a dança passa pelo meio da ludicidade”, relata.