Missão arqueológica descobre artefato de 24 mil anos

Um artefato de pedra enigmático, datado em 24 mil anos e original em relação a outros contextos arqueológicos paleoamericanos, foi encontrado por um time de pesquisadores no sítio arqueológico do Vale da Pedra Furada (Piauí). A descoberta, divulgada durante a última semana na revista americana Plusone, impacta as discussões no meio acadêmico no Brasil, Estados Unidos e Europa, já que reforça os estudos sobre o povoamento antigo nas Américas, que ocorreram há cerca de 40 mil anos. A novidade é que a peça arqueológica apresenta biografia instrumental complexa e tem caráter irrefutavelmente antrópico, ou seja, é derivado de ação humana.

A professora do Instituto Goiano de Pré-História e Antropologia (IGPA) da PUC Goiás, Sibeli Viana e o egresso do curso de Arqueologia da universidade e doutorando do Museu Nacional (UFRJ), Marcos Ramos, estão entre os pesquisadores que participaram dessa investigação científica, coordenada pelo prof. Eric Boëda, docente da Universidade Paris-Nanterre (França).

 A iniciativa integra a Missão Arqueológica Franco-Brasileira do Piauí (FBMP), liderada por Boëda, que desde 2008 desenvolve pesquisas interdisciplinares em diferentes sítios arqueológicos na região do Parque Nacional Serra da Capivara. O conjunto de dados coletados detêm uma importância para além da região Nordeste do Brasil, que pode ser observada em vários aspectos.

“Eles reforçam, por exemplo, o cenário que sustenta fluxos ocupacionais nas Américas em períodos pleistocênicos (Pré-Último Máximo Glacial, entre 23 e 19 mil anos antes do presente), diferente do modelo anterior que defendia uma ocupação mais recente nas Américas, há cerca de 15 mil anos. Segundo esse último modelo, povos vindos da Ásia teriam cruzado pela Beríngia e rumado para sul através do corredor livre de gelo sobre o território do atual Canadá”, informa a docente.

O estudo não confirma uma correlação genética da ocupação humana do Piauí com os povos antigos da América do Sul e de outros continentes, pois as condições ambientais dos sítios antigos, especialmente, aqueles encontrados a céu aberto e em clima subtropical não permitem a preservação de remanescentes orgânicos (encontrados em esqueletos humanos) que possam esclarecer o enigma. Porém, de acordo com o pesquisador Marcos, essa hipótese é motivadora para a equipe franco-brasileira, já que o artefato encontrado tem uma importante variabilidade tecnológica, que exige um conhecimento apenas possível em contextos humanos.

“Consideramos que a ausência de dados genéticos relacionados às populações mais antigas no cenário em construção sobre o povoamento da América do Sul não refuta os dados provenientes das análises sobre as culturas materiais presentes nos sítios”, analisa. Já as correlações culturais ainda estão sob investigação, já que cada contexto arqueológico conta com uma gestão de matéria-prima e esquemas tecnológicos de produção específica.

Os estudos do professor Boëda abordam outros aspectos do povoamento das Américas, como as temporalidades, os sistemas de assentamento, os sistemas técnicos, a biogeografia humana, as interações com megafauna, etc. A parceria entre a missão franco-brasileira e a PUC Goiás, intermediada pela professora Sibeli, tem fortalecido a rede de pesquisas em Arqueologia nesta universidade, assim como tem possibilitado que alguns alunos do curso de Arqueologia da Escola de Formação de Professores e Humanidades (EFPH) tenham possibilidade de conhecer e colaborar em escavações arqueológicas em contextos de temporalidades mais antigas do que os sítios arqueológicos do Centro-Oeste do Brasil.

Mais informações sobre a missão podem ser obtidas no site www.missionfrancobresiliennedupiaui.com